quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Tráfico de Seres humanos – Um clamor de justiça!

“Somos chamadas a construir a vida,
abertas aos apelos do Espírito que se manifestam,
nos sinais dos tempos e apela a nossa presença,
lá onde a vida está por um fio...
É preciso recolher os pedaços de vida que ainda sobram
antes que se percam”. (Ana Roy)

A Vida Religiosa Consagrada Inserida junto aos Empobrecidos e empobrecidas assume a missão de ser Boa Notícia do Evangelho aos pobres, pautando sua práxis na mística da encarnação de Jesus de Nazaré que veio para que todos/as tenham vida e vida em abundancia (cf. Jo, 10,10).
Procurando discernir em cada momento histórico os apelos de Deus, vindos dos clamores dos pobres, que em cada época e contexto foram se apresentando com um eloquente clamor por Vida e Libertação, foi assumindo espaços e projetos concretos de aproximação e compromissos, que expressem significativamente os valores de sua vocação-missão
Hoje, num contexto de “mudança de época’, marcada por velhas e novas pobrezas que configuram cenários, rostos, sujeitos emergentes: Mulheres, juventudes, crianças e adolescentes, povos Indígenas, afro descendentes; idosos e doentes em situação de vulnerabilidade social, exclusão, violência, migração forçada e tráfico de pessoas. Entendendo que a fidelidade às origens fundacionais, passa pela vivência da Solidariedade na defesa e resgate da vida ameaçada, sensibiliza e assume com entranhas de misericórdia o ser presença de solidariedade samaritana junto às pessoas, que em situação de vulnerabilidade e risco pessoal e social têm sua dignidade ferida pela violência institucionalizada das redes criminosas do tráfico humano.
O tráfico de pessoas, sobretudo de mulheres e crianças, que são as vítimas em potencial deste ilícito negócio, é hoje um dos mais urgentes apelos históricos para a Sociedade, e com especial convocação para a Igreja e a Vida Religiosa cuja, missão de cuidar, proteger, defender e promover a vida ameaçada é imperativo teológico. Faz parte das afirmações fundamentais da teologia cristã recusar qualquer tipo de violência como expressão da violação de direitos humanos, a ela se opor, denunciá-la e contribuir para sua superação.

A Triste Realidade do Tráfico de Pessoas

Como uma transação comercial iníqua que coloca as pessoas a serviço do lucro, ferindo gravemente o ser humano no que tem de mais precioso: sua dignidade e liberdade de filhos e filhas de Deus, sujeitos e cidadãos/ãs de direitos, o Tráfico de Seres Humanos (TSH) é uma prática criminosa hedionda. Uma rede altamente lucrativa que ocupa o terceiro lugar na economia mercadológica do crime organizado, perdendo apenas para o tráfico de armas e drogas. Atinge cerca de 2,5 milhões de vítimas, movimentando, aproximadamente, 32 bilhões de dólares por ano. (UNODC Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime). Estima-se que 700 mil mulheres e crianças passam todos os anos pelas fronteiras internacionais do tráfico humano. Isso sem contabilizar o tráfico interno, que no nosso País e alarmante.
Atualmente, esse crime está relacionado a práticas criminosas de violações aos direitos humanos, para fins de exploração sexual comercial, muitas vezes, ligadas a roteiros de turismo sexual, de mão-de-obra escrava, e também, para remoção e venda e de órgãos. Configura uma das formas mais explicitas da escravidão do século XXI. Uma das piores afrontas à dignidade humana e uma das mais cruéis violações dos direitos humanos. Vulnera e viola a dignidade das pessoas, mercantilizando e ferindo seus corpos, matando seus sonhos e direito de viver.
A pobreza, o desemprego, bem como a ausência de educação e de acesso aos recursos constituem as causas subjacentes ao Tráfico de Seres Humanos. As mulheres são particularmente vulneráveis ao tráfico de seres humanos devido à feminização da pobreza, à cultura de discriminação e desigualdade entre homens e mulheres, à falta de possibilidades de educação e de emprego, a cultura hedonista que transforma o corpo da mulher em objeto de desejo e cobiça.
O Brasil é País de origem, trânsito e destino desta prática criminosa. É responsável por 15% das pessoas exportadas da América Latina para a Europa. (Fundação de Helsinki pelos Direitos da pessoa humana.). O mapa deste comércio tem sempre uma constante: as pessoas traficadas são, na sua grande maioria, mulheres e crianças, provenientes de regiões pobres e levadas para as regiões ricas, uma vez que a mobilidade forçada acontece em geral pela necessidade e o sonho de uma vida melhor.
Com a escandalosa exclusão social, corrupção e a impunidade, estes números estão crescendo, e neles há corpos, que gemem e gritam por socorro. São milhares de mulheres, crianças e adolescentes violentadas e torturadas física, moral e psicológicamente a cada dia na roda viva do tráfico humano. Urge uma ação determinada e firme de todos. Das autoridades competentes, para coibir, punir os que traficam. Do estado e a sociedade no sentido de denunciar, informar, e educar; assistir e proteger as vítimas, e acima de tudo de lutar pela superação das causas geradoras e sustentadora desta iníqua realidade.
A Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (2006) reconhece o tráfico humano como um problema multidimensional que necessita de ações articuladas com os diferentes setores e atores sociais. Traz um conjunto de Diretrizes, princípios e ações norteadoras da atuação do poder público no combate ao tráfico de pessoas. Seu texto está estruturado em três eixos: prevenção, repressão ao tráfico e responsabilização de seus autores e atenção às vítimas. Não obstante o reconhecimento do esforço realizado, esta tarefa ainda está muito aquém da necessidade e urgência que apresenta.
Está em curso no Ministério da Justiça a Construção do II PNETP – segundo Plano Nacional l de enfrentamento ao tráfico de pessoas. Um convite a toda a sociedade a se articular e participar com sugestões propositivas.


A resposta da Vida Religiosa Consagrada:


O clamor das mulheres, adolescentes e crianças traficadas, se impõem hoje como um incessante grito do Deus na Vida. Pela força do Carisma a da missão de seguir Jesus no caminho dos pobres, a Vida Religiosa Consagrada, num movimento dinâmico de fé e solidariedade é convocada a viver a Consagração-Missão nas periferias e fronteiras das causas humanas, auscultando as interpelações de Deus no hoje da história.
Atentas e sensíveis a esta “realidade-clamor”, que convoca a todas e todos a estar de maneira estratégica ao lado das pessoas indefesas, com uma práxis articulada de solidariedade e cidadania a serviço da vida. Religiosas de várias Congregações têm nas últimas décadas, assumido mundialmente, a luta pela erradicação do tráfico de pessoas, como um campo de atuação missionária. Um espaço e causa de fronteira na qual Deus a impele a reagir e agir com solicitude e audácia profética.
Sensibilizar e socializar informações sobre o Tráfico de Seres Humanos; capacitar multiplicadores, multiplicadoras para ações educativas de prevenção e assistência e intensificar a luta por políticas públicas de enfrentamento desta realidade. É a tarefa que tem sido assumida pela Rede um Grito pela Vida desde março de 2006.
A Rede Um grito pela vida é Intercongregacional, constituída por religiosas de diversas Regionais e Congregações. Um espaço de articulação e ação solidária da Vida Religiosa Consagrada do Brasil. É parte constitutiva da CRB Nacional. Aberta e atua de forma descentralizada e articulada com as organizações e iniciativas afins nas diversas localidades Estados e municípios. Integra a Rede Talitakun, a Rede internacional da VR no enfrentamento ao Tráfico Humano, coordenada pela UISG – União Internacional das superioras Maiores.
Compreendendo que trabalhar neste campo não é só uma opção, mas um “imperativo bíblico-profético” D’aquele que Vê, ouve e desce para libertar seus filhos e filhas da escravidão’ (cf. Ex 3,7), D’aquele que enviou seu filho único nascido de uma Mulher, para dar sua vida em resgate de outras vidas. (cf. Gl 4,4), e das mulheres discípulas que com refinada astúcia, cumplicidade e solicitude ao Espírito de Deus, foram protagonista no resgate, defesa e promoção da vida umas das outras. As religiosas que integram a Rede Um grito pela Vida, atuam nas diversas regiões do país, articuladas em núcleos, integradas com as organizações eclesiais e civis, fomentando, promovendo e/ou participando de atividades e processos de prevenção, assistência as vítimas e intervenção política que contribuam para instruir e instrumentalizar a sociedade, e coibir o crescimento da inserção de vítimas neste mercado do crime.
Dar um basta ao Tráfico de Seres Humano, é tarefa de todos. Dever do Estado e da sociedade. A Rede um Grito pela Vida é um caminho que nos permite ampliar alianças intercongregacionais em prol da vida ameaçada e ferida das pessoas traficadas. Caminho que nos possibilita ensaiar passos de encarnação em novos espaços sociais, políticos e teológicos para incidirmos nesse fenômeno, que cresce de maneira assustadora. Sutil e vorazmente vai ceifando os sonhos e a vida das crianças e adolescentes, juventudes e mulheres de nossas comunidades.
Agradecemos a presença e participação de todas e todos que somam conosco nesta luta e reafirmamos para toda a Vida Religiosa Consagrada o desejo de vê-la sempre mais comprometida com esta e outras causas que ferem a Vida em todas as suas dimensões. A REDE UM GRITO PELA VIDA é um espaço aberto e espera encontrar nas Congregações, Regionais e Organizações afins, adesão, apoio e empenho no enfrentamento desta realidade de agressão aos Direitos Humanos e ao próprio Deus.
Gestos simples desencadeiam ações de libertação: Colocar a questão em pauta em todos os espaços possíveis: igrejas, escolas, hospitais, inserções, obras e projetos sociais, em vista da formação da consciência e ações de intervenção na realidade. Articular forças – atuar em redes e parcerias com a sociedade civil e o poder público. Somar na luta por políticas públicas para a juventude e mulheres. Rezar e aprofundar esta realidade, à luz da Palavra de Deus. Esta tem sido a ciranda do reagir e agir permanente das religiosas da Rede um Grito pela Vida e da TALITAKUN nos diversos núcleos e localidades do país e do mundo. Sensibilize-se, informe-se e participe. Some nesta missão!

Irmã Eurides Alves de Oliveira, ICM
ireurides@hotmail.com
Rede Um grito pela vida
(redeumgritopelavida.blogspot.com)

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