CARO
LEITOR E CARA LEITORA DESTE bLOG DA Vida Religiosa Inserida e Solidária:
Postamos abaixo dois
ricos textos de reflexão e aprofundamento, trabalhados pelo Assessor Frei Luis
Carlos Susin, durante o Seminário da Vida Religiosa Inserida e Solidária do RS,
de 29 a 31 de agosto de 2014. Bom
Proveito!
Os horizontes da missão sem fronteiras sob um céu imenso
Se as coisas são inatingíveis... Ora!
Não é motivo para não querê-las:
Que tristes os caminhos se não fora
A mágica presença das estrelas.
(Mário Quintana)
Horizontes,
assim como fronteiras e firmamento, provêm da nossa experiência cósmica, do
mundo físico, mas se tornam metáforas do humano e da convivência humana nos
tempos que vivemos. Antes de falarmos de
horizontes, é necessário falar de fronteiras: com a modernidade houve uma
grande movimentação colonialista que transgrediu fronteiras de culturas e
economias locais, um “colonialismo sem fronteiras”. Depois houve um
nacionalismo crescente, com fortalecimento de fronteiras, até explodirem as
duas grandes guerras no século XX e vir abaixo a cortina de ferro do comunismo.
Desde então estamos metidos numa globalização altamente transgressora de
qualquer fronteira, o “mercado global” que novamente coloniza, destrói
economias e políticas locais, cria indiferença – tudo é igual, tudo com sabor de McDonald. E novamente
surgem tentativas de fortalecer fronteiras com novos muros, como no Ocidente Médio e entre Estados
Unidos e o resto da América abaixo. Porque há esse desequilíbrio de fronteiras?
Não estamos todos sob o mesmo firmamento, sob o mesmo céu?
O horizonte
não é uma fronteira. É o ponto de encontro entre a paisagem com suas fronteiras
e o firmamento que nos pode “firmar” acima e além de qualquer fronteira,
paisagem assegurada pelo firmamento assim como ele segura as estrelas. O
horizonte pode ser visto como uma linha de distração, mas é também, e,
sobretudo, o ponto de encontro entre a terra e o céu.
A falta de
horizontes comuns transforma cada fronteira numa trincheira de guerra, e as
relações de lado a lado se transformam em choque dos diferentes. É necessário
encontrar horizontes, pontos de orientação e de projetos comuns. Sem partilhar
horizontes seremos sempre mundos diferentes, distantes ou em choque e
desequilíbrio, ora avançado e transgredindo, violentando os espaços dos outros,
ora erguendo muros armados, muralhas de defesa em que outro é sempre declarado
um inimigo. Horizontes comuns são absolutamente necessários para a convivência
numa paisagem comum. Mas o que é mesmo um horizonte?
Horizonte – é
necessário repetir – é a o ponto extremo da paisagem, em que a paisagem se encontra com o firmamento, a terra com o
céu, e, portanto mais do que uma linha
divisória, é um ponto de encontro, de convergência. Por um lado, é onde se
levanta o sol, e, portanto, de onde nos chega a luz para vermos bem a paisagem
e a energia para nos animar e fazer andar. O horizonte permite, portanto,
termos uma visão global, um ponto de vista orientado, inspirado e caloroso. O
raio de sol que vem do horizonte e nos vitaliza, nos põe em marcha, esclarece o
nosso caminho, potencializa nossas forças. Por isso, por outro lado, o
horizonte se torna uma meta de nossos caminhos na paisagem e nos contextos
variados de vida. Inspira um “projeto”, guia os passos, as prioridades, as
estratégicas, até as mais cotidianas ou monótonas.
Horizontes
comuns são necessários para projetos comuns. No entanto, conforme a situação de
cada pessoa ou grupo ou mesmo nação no contexto da paisagem, o horizonte ganha
uma modulação, um modo próprio de circundar a paisagem do mundo conhecido. Por
isso precisamos reconhecer o pluralismo de horizontes e falar no plural: há
diferentes horizontes que emolduram paisagens diferenciadas de acordo com a
posição onde se situa quem está na paisagem. Este pluralismo de horizontes é
uma grande riqueza, comporta pontos de vista diferentes e modos diferentes de
ver o mundo, permite travessias diferentes. Mas é também um grande desafio, o
de nos entendermos realmente uns aos outros com tantos horizontes e tantas
percepções diferentes. Chegamos a ter línguas diferentes, corpos diferentes.
Podemos constatar que vivemos em mundos tão diferentes a ponto de já não termos
mais contatos. Podemos, então, cair na indiferença de um pluralismo que nos
fragmenta e torna tudo tão relativo que já não compartilhamos modos de ser e
caminhos comuns. Como lidar com horizontes diferentes?
Os viajantes
aprendem que horizontes diferentes podem enriquecer com pontos de vista
diversos. E estes redundam em maior conhecimento se houver uma troca de ensinamentos e de testemunhos de
modos diferentes de vida. Para que haja uma troca de pontos de vista e de
compreensão de horizontes diferentes é necessário exercitar-se na troca de
palavras, é necessário ser, de certa forma “poliglota”, aprender a ter prazer
em saber algo da língua e do modo de ser de outros. Somente quem sempre ficou
no seu próprio ninho confunde o mundo com a sua pequena paisagem em um
horizonte pequeno.
Para termos
largos horizontes, é necessário ser abraâmico, ser peregrino, abrir nossa
sensibilidade para o que nos chega de além de nosso mundo. Abraão atravessou
impérios, da Mesopotâmia ao Egito, Obedeceu a inspiração de ser um peregrino
porque recebeu um sinal do firmamento, das estrelas do céu: seu futuro seria
mais vasto do que as estrelas que ele via no firmamento imenso em uma noite
límpida do deserto. E sua paisagem árida seria suficientemente desconfortável
para não sucumbir à tentação de se acomodar num mundinho arrumado. Ele foi
peregrino do deserto e do firmamento, orientado pelos raios de sol de uma
promessa maior do que seu mundo presente. Abraão é um modelo bíblico de
horizontes abertos ao firmamento, de um projeto infinito criado pela Palavra e
pela confiança nela, por uma relação que ultrapassou fronteiras.
Fronteiras
também são necessárias para não se cair na indiferença e na violação dos
espaços e dos mistérios uns dos outros. Mas fronteiras são lugares de “frente a
frente” entre alteridades e seus mundos, são o lugar de encontro marcado para
estar “face a face” ou mesmo na “com-frontação” da palavra, do debate, da troca
de bens, da transformação da hostilidade. Isso é possível quando temos por cima
de nossas cabeças um firmamento comum, o céu imenso donde vem toda energia e
inspiração sem fronteiras. É, na verdade, o céu que nos alarga de tal forma os
horizontes que podem entrever nossa peregrinação e nossa missão “sem
fronteiras”. Há hoje uma porção de ONGs “sem fronteiras”, das quais a mais
célebre é “Médicos sem fronteira” por entender que salvar vidas é uma exigência
que não conhece nenhuma fronteira. Mas a Vida Consagrada como modo de ser
cristão conhece há séculos esta exigência humana e evangélica “sem fronteiras”,
chamada a horizontes vastos, provocadores de sua peregrinação.
Horizontes são
entrevistos em cada paisagem, ou seja, também em cada tempo, em cada época do
Espírito. No intercâmbio de pontos de vista sob horizontes comuns é que as
diferentes formas e congregações de vida missionária podem se ajudar e se
tornar também peregrinas fecundas de vida por onde andam. Sem partilhar
horizontes, sem metas ou prioridades e projetos comuns, vamos nos reduzindo a
mundinhos sem mais sentido. O Brasil se tornou, nas últimas décadas, um país
que não só recebe, mas envia muitos missionários e missionárias para
além-fronteiras, para horizontes e paisagens mais vastas. Estamos num bom
caminho? Partilhamos horizontes para caminhar?
Questões
1.
Porque horizontes são importantes como metáfora do ser
humano?
2.
Qual a melhor atitude diante do pluralismo de
diferentes horizontes?
3.
Se a Vida Consagrada é convidada a ir “além-fronteiras”,
como é possível a missão sem que ela cometa violação do modo de ser de outros?
4.
Se o Reino de Deus, a vontade e o poder de Deus, são um
horizonte último (também os mulçumanos tem este horizonte da submissão à
vontade divina), o que caracteriza o modo cristão do Reino de Deus para que
seja mais concreto e identificável?
Frei
Luiz Carlos Susin.
Um olhar sobre o nosso mundo e nossa Igreja e missão
Introdução: O papa Francisco exortou, na EvangeliiGaudium, a evitar
“excessivos diagnósticos” que acabam paralisando ao invés de ajudar a passar
para as tarefas que nos competem. Além disso, não se pode ter um olhar neutro e
asséptico, mas um olhar interessado: discernir evangelicamente o mundo em que
somos chamados a viver nossa vocação e nossa missão evangelizadora (EG 50).
- O mundo em
que vivemos:
Quem tem mais
idade poderia perguntar sem saudosismo: realmente progredimos, somos hoje um
mundo melhor? Alguns pensadores insistem em que a humanidade como um todo
espera e busca incessantemente “ser melhor” e faz esforços para isso, o que dá
esperança. Mas em que sentido está melhor o nosso mundo? Com mais tecnologias
em todas as áreas: na medicina, no transporte, na comunicação, na indústria,
nos serviços, no profissionalismo, no lazer. Temos uma multidão de produtos e
de equipamentos, e crescemos como nunca em conhecimentos e quantidades. A
qualidade é que não está garantida, exige nova criação, de modo especial em
posturas éticas. Somos uma sociedade de “mercado global” em extensão e em todos
os aspectos, até religiosos: tudo é para vender e consumir.
Por isso resumimos
nosso mundo em CTPC: “Crescimento,
Tecnologias, Produção, Consumo”. O consumo, na ponta final, é a lei geral e
sacrossanta válida para todos. Lula integrou muitos pobres à sociedade
brasileira através da facilitação do consumo. O consumo é o grande mandamento,
a ética e a felicidade imposta. Nem pobre quer apenas comer e vestir um pouco
melhor. O consumo é engatilhado pela propaganda, “alma do negócio”, que suscita
desejos e os torna necessidades imperiosas, inclusive para os pobres. A
propaganda nos convence que somos infelizes e pouco importantes até que não
tenhamos certos produtos para consumir – que farão nossa felicidade,
preencherão nosso vazio e nossa ânsia. Quando os tivermos, porém, seremos ainda
infelizes por não termos os seguintes, a nova geração de produtos. É necessário
consumir sempre mais para que se continue a máquina do crescimento na produção
de coisas tornadas necessárias pela propaganda de consumo, uma roda giratória
sem limite. Hoje consumimos e nos nutrimos de tecnologia, sobretudo de TI,
Tecnologia de Informação. A tecnologia não é mais “ferramenta”, mas é
“ambiente”, é casa, e mesa, é nutrição pela qual consumimos inclusive nossas
relações sociais: a forma de nos comunicarmos torna-nos potencialmente
onipresentes: num “clic” temos virtualmente quem nós queremos presentes em
nossa rede, em nosso celular ou laptop. Isso transforma agora rapidamente as
relações familiares, educacionais, institucionais. A realidade virtual, com o turbilhão
de comunicação e informação, agigantou-se e a realidade física “encolheu”,
inclusive nas relações. Onde vai parar não sabemos, mas estamos mais conectados
com o mundo e menos com os de casa.
O crescimento
tecnológico acrescentou domínio às forças típicas de “império”, um poder mais
ou menos oculto e invasivo sobre o mundo globalizado pelo mercado. A
geopolítica e os governos, reféns das empresas globais, dependem disso na
guerra de mercados: tecnologia mais avançada, energia e mão de obra barata e
uma casta de administradores bem pagos. Isso criou uma nova desigualdade,
puxando para baixo o custo do trabalho, dos salários em todo o mundo, e uma
elite de administradores bem pagos abaixo dos donos de capital, muitos dos
quais sobrepujam sozinhos nações inteiras. Os governos dançam nesse ritmo. A
“financeirização” deste ciclo CTPC criou bolhas de papel, mas a economia
financeira e especulativa é a alma invisível, o pivô que faz girar a roda do
mercado. O Papa Francisco chamou de “idolatria
do dinheiro” acertando no olho: somos colocados de joelhos, fazemos
sacrifícios e pagamos taxas de promessas diante dele, ricos e pobres, quem tem
e quem não tem. O dinheiro tudo pode, tudo promete – a quem lhe paga tributo,
suor, inteligência, dedicação. A população assalariada nos aglomerados urbanos,
apertadas no tempo e no espaço, cujo emblema são as horas em ônibus apertados
para o trabalho, deteriorando a qualidade de vida, cresce em ansiedade, stress,
insegurança, luta por se colocar de forma minimamente digna no mundo que
cresceu em desigualdade, e luta por atendimento de saúde, educação, moradia,
transporte. E por dinheiro, salário: somos o século do desaparecimento da
economia de subsistência, e toda a economia, também dos pobres, é mediada pelo
dinheiro. Sem ele é a fome. Repensar, então, o crescimento, o mandato de
crescer, é preciso. O que é mesmo “crescer”?
Aliada ao
consumismo, está o culto ao extremo individualismo que vai estruturando a vida
numa época “pós-social”: cada um com seu celular e seus fones de ouvido,
indivíduos flutuando ou se apertando na massa, em fila. Quem tem carro
escurece os vidros e busca a solidão para se proteger. O consumo é mais intenso
quando é individualizado ao mesmo tempo
em que é generalizado. As crianças são seduzidas ao mesmo comportamento,
tornando-se elas mesmas sedutoras dos adultos em termos de consumo até de
carros. Não há limites para este tipo de crescimento num mundo limitado de
recursos e fragilizado pelo abuso? O sintoma deste sistema adoecido aparece por
todo lado ecologicamente. A relação entre massas sem rosto e indivíduos
flutuando na massa paralisa tanto os indivíduos como as massas. Falta, no meio,
a comunidade, as relações de pertença e responsabilidade em tamanho viável, e
disso decorre a “crise de empenho
comunitário” que afeta também a Igreja (EG cap II).
No entanto, reações saudáveis emitem testemunhas
alternativas: um estilo de vida sóbrio, fundado em princípios sólidos, com
relações humana de cuidado e fidelidade, com projetos de vida em grupos
alternativos, emerge em diversas partes: “Vida simples” em paises anglo-saxões,
“Decrescimento feliz” em países latinos, “Caminhos de sol” em busca de novas
energias, etc. Formas de solidariedade diversas e criativas aproveitam as novas
formas de comunicação em rede global para se expandir. Um senso comum de que é
necessária uma grande transformação toma corpo. A solidariedade com o nosso
mundo está exigindo também solidariedade com manifestações públicas de grupos e
multidões que clamam por mudança neste tipo de civilização: “ Indignados”,
“Primavera árabe”, “Ocupar Wall Street”, “Sim, podemos” (Yes wecan!), os
movimentos e organizações que se encontram no Fórum Social Mundial, etc.
“Manifestações” certamente vão ocorrer sempre mais nos próximos tempos, e
alguma forma de participação adequada será uma exigência ética. A vida não pode
ser só mercado, tecnologia, produção, consumo, finanças, fluidez de valores,
consumo, consumo, consumo – e migração, mão de obra barata em analogia de
escravidão, energia a qualquer custo ecológico, recuo no individualismo. O
mesmo Papa Francisco clama por uma mudança de sistema global, de modo de
civilização. Alguém precisa começar.
- Nosso tempo de Igreja.
A Igreja
ganhou, com o Papa Francisco, uma aragem de primavera, um exemplo pastoral com
gestos e palavras que surpreendem pela jovialidade evangélica, pela
centralidade da boa notícia de Jesus sem antepor doutrina, nem dogma, nem lei, nem ritual ou
instituição. Este fato maior dos últimos tempos tem futuro, desenhado na
Exortação Apostólica EvangeliiGaudium. Ao seu otimismo evangélico de base ele junta
uma repreensão pastoral aos católicos que vivem um “mundanismo espiritual” com
características de “consumo” religioso para autossatisfação, uma
espiritualidade narcisista, voltada para o próprio grupo, com auto referências
em transcendência real seja na oração profunda seja na dedicação sacrificada.
Ou seja, no fundo há uma crise de fé que, por não acreditar de fato na graça e
na salvação eterna, também não está disposta a abrir mão de confortos e fazer
da vida um sacrifício pela missão. A falta de fé transforma a missão em administração. A
esperança de eficácia da fé fica abalada pelo egoísmo espiritual, que se
esconde em práticas religiosas preocupadas consigo mesmas ou atrás do
pessimismo e da lamentação. Essa descrição um tanto psicológica do católico é
especialmente válida para os líderes, o clero e a atual onda de clericalismo e
autoritarismo, sobretudo jovem.
Numa
antológica expressão do Papa Francisco, “o prazer espiritual de ser povo de
Deus” e de evangelizar se vive em meio a gente simples, “na mística de viver
juntos, misturar-nos, dar o braço, apoiar-nos, participar desta maré um pouco
caótica que pode transformar-se numa verdadeira experiência de fraternidade,
numa caravana solidária, numa peregrinação sagrada”(EG 87). Esse é também o
espírito ecumênico e de hospitalidade inter-religiosa num tempo de risco de
crescimento de hostilidade religiosa por estarmos num planeta juntos como em um
ônibus apertado. O que ajuda a crer nos outros, seja de que credo
forem, é olhar para a Terra desde fora da estratosfera e ver no pequeno
planeta azul a casa comum da grande e única família humana. A humanidade como
uma só e grande família rodeada de outras formas de vida – na comunidade de
vidas -
é o discurso do magistério diante da migração, da celebração do dia
mundial da paz, da ecologia.
No começo do
século XXI continuamos a viver um fato social e religioso globalizado que
desafia e afeta a Igreja: a vida religiosa deixa de ser tradição e cultura
cristalizada, passada adiante com o princípio de autoridade, para ser cada vez
mais “experiência”. A experiência gera autoridade e autonomia. Embora seja
também influenciada pelo mercado, pelo consumo e pela fluidez, a experiência
religiosa se realiza hoje em expressões emocionais, em testemunhos fervorosos,
em manifestações extáticas, em impactos de mudança de vida, em alguns
engajamentos. Hoje um terço dos cristãos de todo o mundo tem algum traço
“pentecostal”, que continua crescendo. No Brasil, a Igreja Assembléia de Deus,
com seu modelo de Igreja “em células”, rede de pequenas comunidades permeáveis
entre si e com ministérios flexíveis, com mais igualdade popular interna, é a
Igreja que está dando mais certo. É a maior minoria. Em diversas regiões,
porém, a soma dos pentecostais já é maioria, passando os católicos para minoria,
como o Rio, o Acre e Goiânia, para nomear duas “pontas”, urbana e de mata, e o
centro. O que isso diz a nós como Igreja Católica? Há duas tarefas
incontornáveis: 1. Formarmo-nos de novo para sermos “discípulos-missionários” a
partir de reais experiências; 2. Transformarmos nossas estruturas paroquiais em
“comunidade de comunidades”, espaços para experiências de fé religiosa e
engajamentos comunitários. A CNBB dá orientações, mas as CEBs já são uma
experiência que contém lições importantes. A forma colegial de governar,
inclusive com leigos e conselhos, a centralidade da Leitura Orante da Palavra
de Deus, a formação dos cristãos em todos os níveis – bíblico, litúrgico,
interpretação do mundo de hoje – a potencialização de carismas, a criatividade
evangelizadora nas ocasiões que se apresentam, são todos desafios para as duas
tarefas maiores de: a) todo cristão católico ser um “discípulo missionário”; b)
toda paróquia ser “comunidade de comunidades”.
A tendência
dos cristãos “nômades urbanos” a buscar “santuários” e centros famosos de
experiência religiosa continua a crescer por todo o Brasil, em todas as
regiões, como também em outras partes do planeta. Essa expressão religiosa é
compatível com a pós-modernidade urbana que tende à mobilidade, apesar de ter
raízes bem antigas. Então outro desafio da evangelização é a conexão entre as
romarias e as “comunidades de comunidades”.
A vida
Religiosa Inserida continua sendo a ponta de lança profética na estrada
bimilenar da fé cristã e da Igreja. É um ensaio de futuro, de novo paradigma.
Sofre a enorme tensão do velho paradigma que tem uma pequena montanha de
resíduos na própria Vida Religiosa Consagrada. Ninguém pode se auto-proclamar
“profeta” (seria “falso” profeta), mas pode se identificar com a “missão
profética” e se deixar tomar pelos carismas missionários. A VRI, por ser uma
ponta de lança missionária, pode parecer frequentemente como voz no deserto,
ação ineficaz no turbilhão do oceano, irrelevante no conjunto da vida social e
da Igreja. A perseverança ao estilo Charles de Foucauld se torna vital nessas
circunstâncias. Entre o cultivo da mística, da oração e da adoração, e a
inserção no modo de vida popular, na rede de relações de vizinhança mesmo
frágil e dedicada aos frágeis, constitui-se o lugar teológico próprio da Vida consagrada nesta mudança de época e
provação da fé e da esperança.
Questões:
1.
A inserção supõe a renúncia a uma vida própria afastada
do conjunto da vizinhança. Quais os pontos de dificuldade para “andar em meio
ao povo” ao modo de Jesus?
2.
O que mantém a esperança e a fé sólidas em meio a uma
sociedade vaporosa, consumista e virtual?
Frei Luiz Carlos Susin.
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